Eu e meus primos...

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segunda-feira, 23 de junho de 2014

Meu primeiro samba de amor

A cabrocha surgira do nada, como se enviada pelos deuses. Meu primo jura que não queria mais nada além de ver a Velha Guarda da Mangueira, a sua escola de coração. Mas se o seu coração for consultado... Quando notou, ela estava ali, sambando ao seu lado. Depois foi o Paraíso na terra: samba, amor e literatura, pois a cabrocha era letrada, gostava de Balzac e de Cartola, de Machado de Assis e Nelson Cavaquinho. Mas nós somos comedores de pão. Os deuses sorriem e logo depois dão gargalhada da nossa condição.

Ele começou a sentir um descompasso. Ela não dizia nada, mas seus olhos diziam. Um dia, voltando sozinho pra casa, caminhando debaixo de uma chuvinha fina que machucava mais a alma do que o corpo, fez a primeira parte:

Hoje, meu samba
tem nuvem de chuva
lambendo a minha dor

Como não sabia o que estava acontecendo nem o que fazer, continuou:

Hoje, meu samba
caminha me mostrando
aonde é que vou

E parou por aí. Ficava cantarolando o samba, ouvindo ele na cabeça e pensando como terminar. Mas não vinha mais nada, nadinha.

Até que veio o dia tenebroso. Foi depois de uma roda de samba. Vieram para a casa do meu primo. Ela, calada. Dormiram em silêncio. Ao amanhecer, o corte. Seco. Não havia o que discutir. Ela saiu pela porta do chatô, meu primo em estado de choque. Mas assim que a porta fechou, como se fosse um milagre veio o final do samba, quem sabe um novo presente dos deuses:

Meu samba,
hoje é feito de tristeza
Mas ele tem a nobreza
de viver um grande amor

Meu samba é para ti
minha querida
uma flor na despedida
daquele que te amou

Pois é. Uma amiga que está em Paris viu num muro assim: "O Amor está morto". Caminhou mais um pouquinho e na mesma rua, em outro muro: "Viva o Amor".

Por isso, preferi chamar o meu primeiro samba de amor de "Nobreza".

Pra quem quiser ouvir esse boi-com-abóbora, tá aqui: Nobreza














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