Eu e meus primos...

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quinta-feira, 19 de junho de 2014

Meu primo faz a Sena

Creio que o século XX já ia pelas tabelas. Meu primo já havia trazido seus gregos para dialogar com Cartola. Agora tentava dar aula de História do Samba. O curso estava abarrotado, tinha ouvinte, visitante e até aluno regularmente inscrito. Contava com duas japonesas, originais de fábrica, que juravam saber sambar e sair em uma escola de Kioto, que não fica na Baixada Fluminense. As aulas teóricas eram bacanas, começando com as festas negras do século XVIII, mistura maravilhosa de sagrado e profano. Mas logo no primeiro dia de aula meu primo colocou no quadro os versos de Noel para servirem de alerta: "Batuque é um privilégio, ninguém aprende samba no colégio".

Sendo assim, havia que sair a campo, ir ao samba. Ou melhor, ir aos sambas, no plural. O samba carioca vivia um momento especial em mais um dos seus eternos ressurgimentos. Teresa Cristina cantando de olhos fechados no minúsculo palco do Semente. A maravilhosa roda aberta da Rua do Mercado no centro. Outra da melhor qualidade na Joaquim Silva. Galloti às terças no Severina. A inesquecível roda da Troça no alto, bem no alto de Santa Teresa. Parodiando Wilson Batista, gastava-se pouco e era divertido.

Foi aí que veio a ideia, sem dúvida soprada pelos deuses. Que tal fazer a Sena? Não aquela montanha de dinheiro, pois Paulinho já dizia que dinheiro na mão é vendaval. A Sena de batuqueiro é outra. Consiste em ir seis noites seguidas ao samba. E assim foi. Seis sambas de enfiada. Nada de porres homéricos ou varar toda a madrugada. Mas seis noites seguidas sambando. Foi divino. Lavou, enxaguou e colocou a alma para secar ao sol da alegria. Poderia ter havido um sétimo dia, é verdade. Mas meu primo ficou desconfiado, teve medo da hybris, do excesso que os deuses punem. A Sena já estava de bom tamanho.

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